sexta-feira, 19 de junho de 2009

Ode 317

Só o ter flores pela vista fora
Nas áleas largas dos jardins exactos
Basta para podermos
Achar a vida leve.


De todo o esforço seguremos quedas
As mãos. brincando, pra que nos não tome
Do pulso, e nos arraste.
E vivamos assim.


Buscando o mínimo de dor ou gozo,
Bebendo a goles os instantes frescos,
Translúcidos como água
Em taças detalhadas,


Da vida pálida levando apenas
As rosas breves, os sorrisos vagos,
E as rápidas caricias
Dos instantes volúveis.


Pouco tão pouco pesarei nos braços
Com que, exilados das supernas luzes,
Escolhermos do que fomos
O melhor pra lembrar


Quando, acabados pelas Parcas, formos,
Vultos solenes de repente antigos,
E cada vez mais sombras,
Ao encontro fatal


Do barco escuro no soturno rio,
E os nove abraços do horror estígio,
E o regaço insaciável
Da pátria de Plutão.

Ricardo Reis / Fernando Pessoa

Um comentário:

  1. Vultos solenes de essência pura e humana!
    Alguns sim, a maioria não?
    Risos que ecoam no singular jargão moderno: putos poetas!
    putos poetas de amargor imenso, carregam a glória de despejar nas veias da vida, o ar da arte, em parte em prol da continuidade da beleza sem fraternidade de poetizar.

    Clarão no céu escuro! Torpedo asiático ou iraniano? Nada véio, poeta nascendo nos escombros da África. Ah, então só-lamento
    ...
    Pessoa: tu é mais que imenso

    ResponderExcluir